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"Quanto mais subo no dorso da montanha, mais pequeno e humilde se sente o meu olhar desta obra criada não sei por quem, (...).

Todas as montanhas são feitas de mudança. A do Pico porque está toda à mão, conjuga sobre si a mutabilidade da paisagem com a longa metaformose da sua própria corpulência. A norte, sobe através de uma sucessão de cotas e linhas de água, parecendo ilusoriamente fácil de escalar; o cone cimeiro, o «piquinho» (que se assemelha, visto do avião, a uma tenda de índio sobre a infinda pradaria das nuvens brancas e rosadas) depressa desaparece da vista, inclinado à vertente oposta; a sul, a montanha torna-se mais bojuda, com a bossa lombar a fazer ressalto para fora da pirâmide. Seja como for, a sul ou a norte, a montanha é o silêncio, o sagrado; um silêncio divinizado e vertical que levaria para muito longe o grito do homem perdido no universo. Com ele, o homem atravessaria o mar do Canal, as montanhas das ilhas, os rios de todos os países do mundo, até encontrar a sua universalidade. Compreendo agora, finalmente, por que razão ascetas, eremitas e anacoretas elegeram a santidade e a perfeição das alturas."

Açores, O Segredo das Ilhas | João de Melo
















Curiosidades:

São cerca de 1000 hectares os terrenos das Vinhas do Pico. Este misto de natureza lávica e práticas culturais ancestrais foram, em 2004, classificados como Património da Humanidade pela UNESCO. As vinhas plantadas em chão de lava são enquadradas por apertadas paredes de pedra solta, chamadas de currais, que as protegem do vento marítimo mas deixam entrar o sol necessário à sua maturação. Estas paredes, se alinhadas, dariam duas voltas à linha do Equador.

A cultura da vinha na Ilha Montanha começou no final do século XV, quando se iniciou o povoamento da ilha.  Mais tarde, o vinho foi exportado para muitos países da Europa e América, chegando até à mesa da corte russa.

Um dos vinhos açorianos mais conhecidos é o Czar, do produtor Fortunato Garcia. O seu nome deve-se ao facto histórico de ter sido encontrado vinho do Pico no palácio do último czar russo, depois da revolução de 1917. Os czares enviavam barcos propositadamente ao Pico para ir buscar os vinhos que chegaram a constar em receitas médicas e a ser mencionados no Guerra e Paz, de Tolstoi.


“O Pico é a mais bela, a mais extraordinária ilha dos Açores, duma beleza que só a ela lhe pertence, duma cor admirável e com um estranho poder de atracção. É mais que uma ilha – é uma estátua erguida até ao céu e moldada pelo fogo – é outro Adamastor como o do cabo das Tormentas.”
As Ilhas Desconhecidas | Raul Brandão



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